quarta-feira, 25 de agosto de 2010

PSICOLOGIA - UMA BREVE INTRODUÇÃO


CINCO FORMAS DE SABER...
Em qual delas a Psicologia se encaixa? 
 
O conheciemento, seja qual for sua fonte, pode ser de cinco naturezas :
  • Senso Comum (saber do dia-a-dia, fruto da experiência cotidiana, sem muito rigor. É o saber que norteia a vida comum, a sabedoria popular). O senso comum possui 7 características : é pragmático (está voltado a questões práticas, do dia-a-dia); é imediatista (se dedica a resolver questões do aqui e agora); a-histórico(não reconhece as determinações hístóricas mais amplas que o determinam); fragmentário (falta-lhe coerência interna e criticidade); utilitarista (é verdadeiro o que dá certo); superficial (permanece na aparência dos fenômenos) e constrói saberes por meio de analogias e ultrageneralizações provisórias, baseadas em confiança, fé ou crenças.
  • Filosofia (mais abstrato que o senso comum, este saber tem por característica a reflexão, o questionamento, a crítica ao saberes estabelecidos. A Filosofia, tradicionalmente, aborda 5 temas gerais : estética, ética, política, metafísica e lógica. Tem por objetivo problematizar, criar questões, e sintetizar os saberes num todo coerente, a fim de se obter da inteligência a sabedoria)
  • Ciência (Método de saber que possui critérios e rigor em sua investigação e construção de saberes, propõe-se a responder as perguntas feitas pela Filosofia, e baseia-se em experimentação, na razão, na univocidade de seus conceitos, análise e síntese de conhecimento, replicação de resultados, quantificação,etc. Possui um lado pragmático, as tecnologias que produz para uso do homem; e outro político, que são as implicações dessas tecnoclogias e saberes nas esferas do poder).
  • Espiritualidade (Enquanto a Ciência está baseada na racionalidade, a espiritualidade, ou religião, ou misticismo, está baseada na percepção imediata, isto é, não-mediada pela razão, da realidade. Ou seja, está baseada na intuição. É um saber “do coração”. Da espiritualidade nasce a fé, e crenças que podem dar origens a filosofias de vida, religiões, misticismos, etc).
  • Arte (A arte possui um caráter polívoco. Isto é, sua produção tem múltiplos significados, “fala como muitas vozes”. A arte é uma forma de saber baseada na contemplação, busca, produção e expressão do Belo. A grosso modo, enquanto a Ciência baseia-se na razão, e a espiritualidade na intuição, a arte faz uso principalmente da emoção).
Mas, evidentemente, há formas híbridas de conhecimento. Assim, um texto de Shakespeare, iminentemente artístico, pode também ter um teor espiritual; ou uma filosofia pode fazer uso do senso comum; (bem como muitos poetas são místicos); ou um artigo escrito por Richard Dawkins pode ser científico e possuir um valor estético ou artístico). 
Nenhuma forma de saber é inferior a outra. Entre elas há tão somente uma relação de diferença, não de hierarquia.         
UM POUCO DE EPISTEMOLOGIA CIENTÍFICA... Definindo o que é Ciência. 
Como a Psicologia pretende ser uma Ciência e, como expresso na página anterior, a Ciência é um método ou forma de saber que possui certos critérios e rigores, cabe-nos explicar seu conceito. Para falar, pois, sobre a estrutura de um saber, faz-se uso da Epistemologia, a Filosofia que cria questões sobre o conhecer.
Falando epistemológicamente, toda Ciência só pode ser entendida a partir da compreensão de seus atributos elementares :
  • Histórico (Quando ela surgiu? Em que contexto sócio-histórico? Quais as intenções, os objetivos de seus criadores?)
  • Alvo de estudo (O que ela se propõe a estudar? Sobre o quê ela pretende criar conheciemnto?)
  • Metodológico (Quais os métodos de análise e síntese de conhecimento dela? Quais os critérios observados neste método, e até que nível de rigor?)
  • Instrumental (O que seu praticante usa para trabalhar?)
  • Pragmático (Para que seve esta Ciência? Quais suas contribuições? O que ela está fazendo na prática? Como ela está alterando a realidade?)
  • Político (Quais as consequências dessa Ciência nas esferas do poder e nas instituições sociais?)
Mais a frente nesta postagem (no item “O Que É Psiciologia, Então?”) encontram-se algumas respostas para estas questões no que diz respeito a Psicologia.                 
RAISES FILOSÓFICAS... Como os filósofos influenciaram a Psicologia.  
Muito antes de existir a Psicologia, a Filosofia já se atarefava de investigar (por métodos diferentes) e problematizar questões relativas ao mesmo objeto desta. Sendo a Filosofia uma perpétua fonte de reflexões abstratas, desprovidas do elemento empírico, e de profunda importância para a formação dos saberes, cabe estudar como esta influenciou o aparecimento da Psicologia.
Podemos dividir em duas fases a história da influencia filosófica na Psicologia : uma inteiramento filosófica e outra pré-científica.
 
FASE FILOSÓFICA (VI a.C. – XVI)
 
Subdivide-se em três fases : cosmocêntrica, antropocêntrica e teocêntrica.
 
A fase cosmocêntrica começa na Antiguidade Clássica, com os filósofos pré-socráticos, e suas especulações sobre a natureza da realidade sensível, sobre as origens e atributos do mundo físico. Marcada pelo surgimento de idéias como a do atomismo, que influenciariam escolas modernas de Psicologia. O alvo desta fase é a natureza da realidade física externa, do mundo.
 
A fase antropocêntrica inicia-se com Sócrates, que faz da Filosofia um exercício de questionamento sobre o saber; Platão, que discute a essência da alma, o mundo das idéias, e Aristóteles, que escreve um tratado especulativo sobre temas como personalidade e a percepção, chamado “Sobre as Almas”. Nesta fase, a Filosofia desloca suas perguntas para a natureza da alma, isto é, da totalidade psíquica ou consciência humana; pressupondo esta imortal.
 
Na Idade Média têm-se a fase teocêntrica, baseada na dogmática filosofia escolástica de padres da Igreja Católica como Tomás de Aquino e Santo Agostinho, que fizeram releituras de Aristóteles e Platão, adaptando-os a Sagrada Escritura Judaico-Cristã. A sub-fase teocêntrica da fase filosófica da Psicologia pouco contribuiu para sua formação.          


A PSICOLOGIA MODERNA... Os primeiros passos rumo a se tornar Ciência. 
FASE PRÉ-CIENTÍFICA (XVI – 1879)
Com a Modernidade veio a rejeição ao dogmatismo medieval, a valorização da razão (inspirada nos moldes clássicos gregos), e o nascimento da Ciência. A Psicologia ainda era tratada como um ramo da Filosofia, porém nesta fase recebeu influencias determinantes que a catapultaram para o status de Ciência.
 
Toda essa fase caracteriza-se pela busca da resposta a seguinte questão : “Como se dá o conhecimento? Como é possível ao homem conhecer algo? É realmente possível?”.
 
 
Identifica-se cinco correntes filosóficas modernas que tiveram importância chave para a cientifização da Psicologia. Os métodos e escolas em Psicologia que apareceriam no século seguinte (XX) se inspirariam em uma ou outra destas cinco tendências filosóficas:
 
 1. EMPIRISMO CRÍTICO, (de Descartes, Locke e Kant), que professava a importäncia de um método racional, quantificador e experimental para o estudo dos fenômenos mentais, estipulava a interação entre idéias inatas e aprendizado pela experiência para a formação da mente (termo que substituiu o aristotélico-medieval “alma”).
2. ASSOCIACIONISMO (que teve Darwin, Mill e Spencer, pensadores ingleses, como expoentes) pelo qual o todo consciente da mente era a somatória de idéias simples, que se associavam gerando redes cada vez mais complexas. (Note o atomismo presente). Com Darwin, essa idéia foi acrescida ainda do conceito de evolução.
3. MATERIALISMO CIENTÍFICO. Pelo qual apenas o positivo (isto é, o observável e quantificável) é alvo de estudo científico. Buscava a objetivização do saber. Influenciou pensadores como Marx e Comte.
4. FENOMENOLOGIA. Foi o método de questionamento e investigação intrapsíquica de Husserll, que usava a instrospecção e eliminava dicotomias como objetivo-subjetivo, observador-observado, etc.
5. ROMANTISMO. Trata-se de uma visão humanista, pela qual o homem é o essencialmente bom, sendo estragado pela vida em sociedade, porém conservando uma alma que anseia ser amada e ser livre.Teve como expoente Rousseau, e o seu famoso “Mito do Bom Selvagem”.


        
A ERA DAS ESCOLAS... Gestalt, Behaviorismo, Psicanálise, Desenvolvimentistas, Humanistas
FASE CIENTÍFICA (1879 – atualidade)  
O marco histórico do início da Psicologia Científica foi a criação do primeiro laboratório de Psicologia Experimental do mundo, por Wundt, em 1879, na Alemanha. No início, para emancipar-se da Filosofia, a Psicologia se revestiu da terminologia da Fisiologia. Era a Psicofísica de Fechner, repleta de fórmulas matemáticas para descrever e prever a percepção.
 
Duas abordagens marcam a fase científica da Psicologia. O Estruturalismo, pelo qual busca-se saber o “O Quê?” dos fenômenos mentais, suas estruturas universais e imutáveis, identificando-se com a Anatomia; e o Funcionalismo, que busca o “Como?”, e identifica-se com a Fisiologia.
 
 
Inicia-se a Fase das Escolas, que são como ramos divergentes de uma mesma árvore, que estipulam diferentes métodos, pressupostos e objetos de estudo. Destacam-se quatro : 
    
1.   BEHAVIORISMO
Partindo de pressupostos da Filosofia Positivista, o Behaviorismo se consolida como a primeira escola organizada (posterior a Psicofísica de Wundt), usando parcialmente o método científico (pois não teoriza), e propõe-se a estudar o comportamento humano, partindo de uma visão atomista pela qual o homem é produto e produtor de condicionamentos, e seu comportamento é um emaranhado aprendido de respostas associadas a estímulos ambientais. Estuda tão somente o comportamento observável e quantificável (positivismo). Figura em vários campos de atuação, desde o educacional ao clínico. Tem por criadores e expoentes Watson e Skinner.
2.   PSICANÁLISE
Considerada por muitos não como um escola psicológica, mas como algo a parte de toda a Psicologia. Criada pelo neurologista Sigmund Freud no início do século XX, parte do pressuposto da existência de um compartimento da alma chamado “inconsciente”, que determina a vida psíquica do sujeito, sendo parcialmente acessível. O inconsciente freudiano é de natureza iminentemente sexual, sendo a libido a força motriz da alma. Freud criou teorias como o Complexo de Édipo, as Tópicas da Alma (divisões dessa em inconsciente, pré-consciente e consciente, bem como em ego, id e super-ego) e um método baseado na análise e hermenêutica de sonhos, atos falhos, etc. A psicanálise conta com diversos dissidentes, que alteraram em vários pontos e níveis as idéias de Freud. Dentre os quais se destacam Jung, Adler, Reich, etc. Trata-se de uma escola inerentemente clínica. 
3.   GESTALT
Partindo de um arcobouço de informações sobre a neurofisiologia da percepção(Koehler), e somando-se ao método fenomenológico (de Husserl e Merlau-Ponty) e a pressupostos da filosofia existencialista (Sartre), nasce a Gestalt (palavra em alemão que significa “Configuração”).
4.   DESENVOLVIMENTISTAS
Dois teóricos se destacam neste que, na verdade, é um ramo e não propriamente uma escola psicológica : Piaget e Vygotsky. Os dois tentaram responder, basicamente, as mesmas questoes : “Como se dá o desenvolvimento cognitivo? Qual a relação entre maturação e desenvolvimento? Qual o papel do social neste processo? Como se dá a aprendizagem?”. Partindo de dados neurocientíficos, porém divergindo em pressupostos filosóficos, os dois criaram corpos teóricos que dão a essas perguntas respostas um tanto diferentes. Para muitos psicólogos, Piaget e Vygotsky se complementam, para outros, são inconciliáveis.
5.   HUMANISMO
Considerados por muitos mais uma Filosofia Aplicada, refletiu-se em autores como Carl Rogers, que criaram métodos terapêuticos, pedagógicos e assistenciais baseados na concepção humanista do homem, como sendo este o autor-maior de sua história e destino.

        
A ERA TEMÁTICA... Sendo generalista e especialista ao mesmo tempo.
A primeira parte da fase científica da Psicologia caracterizou-se pela pluralidade de escolas que, partindo de diferentes métodos e pressupostos, criavam respostas constrastantes sobre as mesmas questões. Muito se falou da guerrilhas escolástica presente nas faculdades de Psicologia e da grande confusão epistemológica decorrente.
Muitos historiadores da Ciência e psicólogos estão apontando, porém, que essa era está se findando, e dando lugar a outra, marcada pelo enfoque em temas, e não em escolas. Isso se evidencia pelo surgimento de novos campos de atuação profissional como Psicologia Jurídica, do Trânsito, da Educação, Ambiental, Social, Comunitária, etc. Dessa forma, ocorre uma especialização no tema a ser estudado/trabalhado pelo psicólogo. Escolhido o tema, o psicólogo ganha liberdade para obter saberes sobre este de diversas fontes, (desde a Sociologia, Filosofia, Neurociência, Cibernética, Antropologia, etc; ou mesmo de diversas escolas psicológicas).
A chamada Era Temática combina, então, um profissional especializado e generalista ao mesmo tempo.      
O QUE É PSICOLOGIA, AFINAL?... Concluindo uma definição.
 
Em que forma de saber se enquadra a Psicologia? Por vezes ela tende à Arte (como na Psicologia Analítica de Jung), por vezes ao misticismo (como em seu uso nas terapias alternativas), e ainda á Filosofia (Carl Rogers) e ao Senso Comum (você já assistiu a Silvia Poppovic?).
Algumas de suas escolas são semi-científicas (como o Behaviorismo e a Gestalt), outras não o são (como o Psicanálise), outras se apóiam sobre dados científicos (como os desenvolvimentistas). Cada uma dessas escolas usa métodos diferentes : ora o fenomenológico (Gestalt), ora o semi-científico (Behaviorismo), ora a instrospecção (Humanistas), etc. Cada uma dessas escolas concebe um diferente alvo de estudo da Psicologia : para os behavioristas é o comportamento, para os psicanalistas é alma através do inconsciente, para os Gestaltistas é o homem por meio de sua percepção; para os desenvolvimentistas é a relação desenvolviemento/aprendizagem; etc. 
Mas, se lembrarmos que a Psicologia surgiu de uma Filosofia Moderna que estava inteiramente interessada na questão do conhecimento, (ou seja, de como, por quê e se se conhecesse algo), podemos nos perguntar se não é, afinal, o CONHECIMENTO o alvo de estudo da Psicologia. Assim, cada escola enfocou um aspecto diferente do fenômeno CONHECIMENTO : ora os atos observáveis (Behaviorismo), ora a percepção (Gestalt), ora a imaginação e afetos (Psicanálise), ora a maturação fisiológica e as relações sociais (Piaget e Vygostky). Contudo, todos são aspectos, são partes do fenômeno-maior : o CONHECER.
Dizer que a Psicologia estuda o CONHECER pressupõe que ela estuda tanto o conhecedor quanto o conhecido, quanto o processo em si.
Elucidada a questão do alvo de estudo, resta-nos refletir sobre seu método e pragmatismo. Sob o método, entende-se que deve se tratar do Científico, conforme exposto no primeiro parágrafo. Sob o pragmatismo, tenho a dizer que o objetivo da Psicologia enquanto Ciência e Profissão é compreender e manipular as relações de CONHECER, seja no campo clínico (auto-conhecimento), escolar (didática), social (dinâmicas), experimental, etc; a fim de aumentar a qualidade de vida do homem.        
Texto de Alessandro Vieira dos Reis (alef@hehe.com)

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